Colonialismos e Colonialidades

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Apresentação

Colonialismos e Colonialidades: teorias e circulações em português e em francês surgiu de um desejo de comunicação acadêmica entre países, línguas e disciplinas diferentes em torno de uma mesma temática. Por isto, trata-se de um livro bilíngue, digital e interativo. A apresentação que você lê, por exemplo, foi escrita por mim, Natália Guerellus, organizadora do volume, e enviada para os/as 14 colegas que participaram do livro, para que comentassem, acrescentassem, polemizassem e/ou criticassem o que aqui segue. Deste modo, esta apresentação serve de modelo do potencial das trocas que podem existir entre os artigos e você, leitor/a, através da interação digital criada para o livro. Basta criar o seu login e comentar o parágrafo desejado. Seu comentário passará, em seguida, por uma leitura, para evitar os chamados “ruídos”, e será publicado, tornando-o(a) coautor(a), colega de trabalho e parte da rede que estamos construindo.

Origens #

Em 2021 o laboratório MARGE, da Université Jean Moulin Lyon 3, França, através de seu diretor, Christian Côte, e de nosso colega Jean-Pierre Fewou-Ngouloure, lançou o desafio de pensarmos a circulação da literatura (ficção e não-ficção) pós-colonial/poscolonial1 entre quatro sistemas línguísticos: português, francês, inglês e espanhol. Se a leitora e o leitor estiverem habituados com a temática, já perceberam que as dificuldades começam pela própria definição do termo pós-colonial/poscolonial, polissêmico, segundo cada contexto linguístico e cultural em que aparece2. De fato, o resultado do encontro entre os investigadores/as em 2021 foi uma certa cacofonia conceitual.

No entanto, ao invés de sucumbir à dificuldade da comunicação, que compreende, mas vai muito além de questões de tradução, as equipes multinacionais decidiram “começar pelo começo” e repensar conceitos, objetos e suportes a fim de melhor compreender a complexidade inerente ao tema proposto. De minha parte, apresentei o projeto CILIPO-FP3 em 2021, que foi aceito para financiamento pelo dispositivo Bourgeon, da Universidade Jean Moulin Lyon 3 em 20224. O que você lê aqui é um dos resultados do trabalho de mapeamento das possibilidades de diálogo entre dois sistemas linguísticos complexos e desiguais5, o francês e o português. O desafio foi lançado a quatorze pesquisadoras e pesquisadores (doutorandos/as, pós-doutorandos/as, e professores/as em diversas fases da carreira) em 12 universidade do Brasil, de Portugal e da França.

Neste momento, leitora e leitor, é preciso lembrar o contexto periférico em que os estudos sobre os países de língua portuguesa se encontram na França e a dificuldade de integrá-los a projetos interdisciplinares e multinacionais. Um exemplo ilustrativo é a necessidade de, para nos comunicarmos com as demais equipes, termos de adotar uma das três outras línguas (inglês, espanhol ou francês que, como sabemos, são as três mais utilizadas em termos político-econômicos no mundo ocidental). A equipe lusófona, neste sentido, foi a única capaz de trabalhar nas quatro línguas de comunicação do projeto. Esta situação revela muito das questões que envolvem nosso estudo sobre as circulações, quando se trata de colonialismos e de colonialidades a nível global. No entanto, tendo como objetivo a necessidade de favorecer a comunicação entre sistemas linguísticos, decidimos pensar naquilo que os diferentes contextos têm em comum: os colonialismos históricos e as colonialidades contemporâneas.

Você, leitor/a interessado/a nestas temáticas, sabe que os termos poscolonial/pós-colonial6, decolonial/descolonial7, estudos subalternos, epistemologias do Sul8 etc. assumem diversas utilizações e estão sujeitos a interpretações também diversas9. Além disso, eles têm historicidades próprias, aparecendo frequentemente no senso comum e em mobilizações de grupos políticos diversos misturados uns aos outros.

Para não incorrer no risco de filiação a campos ou correntes universitárias específicas como os Postcolonial Studies ou Decolonial Studies, cujas filiações respectivamente anglófona e hispânica é conhecida, decidimos propor diálogos entre a literatura (ficcional e não-ficcional) em português e em francês naquilo que tange os diversos colonialismos históricos e as colonialidades contemporâneas. Ou seja, optamos por utilizar as definições conceituais que servem de base para os campos científicos acima mencionados.

O termo colonialismo, por exemplo, é relativamente recente. Ele não aparece na Encyclopédie Nouvelle (1834-1847), de Leroux e Reynaud, tampouco no Dictionnaire universel, v.4 (1874) de Pierre Larousse. Nestes dicionários, o termo Colônia, palavra latina, vem definido como fonte de riqueza para a metrópole, lugar do imaginário exótico, extensão do império. É somente em 1914 que o termo colonialismo figura no livro Europe Incertaine (1908-1911), de Jean Jaurès, com a seguinte conotação: “doutrina política que prega a exploração pela metrópole dos territórios subdesenvolvidos apropriados por ela para seu único benefício ou para o benefício exclusivo de elementos metropolitanos instalados nestes territórios” (p.313). Somente no século XX, portanto, o vocábulo emerge exprimindo em seu bojo o lado cruel da colonização e integrando, em seguida, os argumentos da luta anti-colonial10.

Hoje, o Larousse inclui uma definição que aponta, de um lado, para a existência de uma sistematização de modos de colonização, evidenciada pelo sufixo -ismo, e, por outro, evidencia a exploração inerente à relação entre colônia e nação colonizadora: “colonialismo é um sistema que defende o estabelecimento e o desenvolvimento de países dependentes como fontes de riqueza e poder para a nação colonizadora”. Já para o dicionário brasileiro Aurélio online, o termo pode ser visto como “doutrina ou atitude favorável à colonização”, “estudo das colônias” ou ainda “interesse pelo que é colonial”, o que desloca o sentido de sistema para múltiplas utilizações, doutrinárias e críticas, ultrapassando o sentido histórico do termo. De fato, os estudos poscoloniais tendem a utilizar o termo como parti pris, estabelecendo uma relação entre colonialismo e os regimes de colonização empregados na África e na Ásia na segunda metade do século XIX, cuja decadência se dá a partir da primeira metade do século XX (caso da Índia, por exemplo).

No entanto, para intelectuais decoloniais, como o peruviano Aníbal Quijano (1992, 11), colonialismo seria a relação de dominação direta, política, social e cultural dos povos europeus sobre os conquistados de todos os continentes11. Quando o autor aponta “todos os continentes”, dá a entender uma cronologia mais ampla do que aquela comumente usada pelos estudos poscoloniais, que começa com a invasão das Américas no final do século XV. Da mesma forma, Quijano estabelece um personagem ativo da instauração deste sistema, ligando o colonialismo aos povos europeus. Temos, portanto, hoje a tendência a pensar a colonização europeia moderna quando tratamos de colonialismos, ainda que o termo possa fazer referência a outros povos, épocas e modos de dominação.

Quanto ao termo “colonialidades”, destacamos a definição de Quijano, para quem estas seriam modos mais gerais de dominação no mundo atual, que podem ser declinadas em: a) modos de dominação que remetem às formas modernas de exploração e dominação (colonialidade do poder); b) formas epistemológicas de dominação, ligadas à produção do conhecimento e à reprodução de regimes de pensamento coloniais (colonialidade do saber); c) formas relacionadas à experiência vivida da colonização e a seu impacto na linguagem (colonialidade do ser); d) formas de criação de um sistema-colonial de gênero, segundo apontam feministas como Maria Lugones (colonialidade de gênero) etc. A estas definições poderia ser acrescentado ainda o fato de que a própria Europa comportou um sistema desigual entre as suas potências ao longo das colonizações e em seguida a elas, em que alguns países aparecem como estando em condição “semi-periférica”, para utilizar um termo de Boaventura de Sousa Santos referindo-se a Portugal em relação a países centrais europeus12.

Partindo destes dois termos - colonialismos e colonialidades -, acreditamos utilizar um vocabulário comum aos contextos que nos interessam aqui: aqueles em que a língua portuguesa e a língua francesa se difundiram pelo mundo. Aschcroft et al. demonstraram, já nos anos 1980, a importância que a questão linguística assume neste sentido, uma vez que disciplinas de ensino básico, como o Inglês e o Francês, nascem no século XIX, e são produzidas pelo mesmo contexto que produz o imperialismo13. No caso português, sabemos que a colonização dos indígenas das américas deu-se igualmente através de um amplo trabalho de compreensão das línguas nativas, de sua sistematização em dicionários e gramáticas e, no século XVIII, de sua proibição em prol do português (Diretório de 1757). As colonizações europeias na África também demonstram a obrigatoriedade do aprendizado da língua colonizadora para que qualquer tentativa de incorporação ao sistema dominador fosse possível. Não é uma coincidência, portanto, que uma parte dos(as) autores(as) aqui presentes trabalhe com o ensino de línguas, cultura ou literatura, e outra parte, com a história, a sociologia e a antropologia. É ambição deste projeto e da rede COS, no entanto, não permanecer nos limites disciplinares, mas promover uma verdadeira interdisciplinaridade coletiva.

Proposta #

Colonialismos e Colonialidades: teorias e circulações em português e em francês propõe, assim, análises interdisciplinares que abrem para novos caminhos de pesquisa e possibilidades de projetos internacionais. O livro foi dividido em três partes: perspectivas teóricas, circulações intelectuais e circulações e mídias.

Na primeira parte, dedicada ao modo como questões teóricas variam em função do contexto de produção e do tema sobre o qual se debruçam, Michel Cahen propõe uma análise ousada sobre os diferentes regimes de colonialidade, a partir de um paralelo com o conceito de “regimes de historicidade”, propondo, então, regimes de historicidade da colonialidade. Cahen contribui, neste sentido, ao relacionar colonialidades e capitalismo, sugerindo uma tipologia, dependendo da região e de sua historicidade colonial/descolonial. Esta articulação serve para afirmar o caráter mundial da colonialidade, não se restringindo à América Latina, como aparece frequentemente nos estudos decoloniais. Bárbara dos Santos, que diagnostica a dificuldade no estabelecimento dos estudos poscoloniais de língua portuguesa na França, em parte devido à incompreensão de certo vocabulário, utilizado de maneiras diferentes em Portugal e na França. Em seguida, a autora faz um apanhado da tradição poscolonial anglófona que se difunde nas universidades francesas e portuguesas, destacando a importância do trabalho de Boaventura de Sousa Santos ao tratar do lugar de Portugal junto às potências imperialistas. O texto de Dos Santos contribui na medida em que aponta a necessidade de conhecermos cada contexto marcado pela colonização e suas consequências para, somente em seguida, podermos compará-los e encontrar pontos de contato que possam fazer avançar os estudos poscoloniais/decoloniais. Elena Brugioni, por sua vez, trata da importância de se pensar as diferentes escalas geográficas quando se procura fazer estudos comparados (local, nacional, regional, mundial), evitando as armadilhas próprias a conceitos como eurocentrismo. Seu ponto de partida são os estudos literários africanos e as diferentes temporalidades que marcam, tanto a produção literária do continente em relação aos colonialismos e às colonialidades, quando as temporalidades da crítica literária que se debruçou sobre ela. A contribuição de Brugioni se dá no sentido de redimensionar a chamada “literatura mundial” e de demonstrar a riqueza dos estudos africanos para os pensamentos teóricos, estéticos e conjunturais, pela sua intrínseca associação entre o literário e o social.

A segunda parte, chamada circulações intelectuais, inicia-se com o texto de Deivison Mendes Faustino, que analisa as diferentes recepções de Franz Fanon (1925-1961) em línguas francesa, inglesa e portuguesa. Seu trabalho contribui na medida em que sublinha a história da circulação de um dos pensadores mais fundamentais do contexto da descolonização, destacando a atualidade do autor martiniquês e a complexa apropriação de sua obra, chegando a criar um campo de estudos próprio: os fanonismos. Sandra Assunção, por sua vez, destaca a importância da voz feminina afrodescendente na produção literária brasileira contemporânea, com destaque para o exemplo de Carolina Maria de Jesus (1914-1977), traduzida em francês a partir dos anos 1960. Utilizando-se da pós-memória como chave de leitura, Assunção demonstra a importância da escritora brasileira para a compreensão do racismo e da desigualdade no Brasil a partir da visão daqueles que sofrem as suas consequências. A pesquisadora contribui, assim, com o estudo de uma obra e uma autora que concentra em seu texto múltiplas características dos colonialismos e das colonialidades brasileiras. Giselle Venâncio e Lucas Cheibub trazem uma análise da circulação do escritor brasileiro Graciliano Ramos (1892-1953) na França, no contexto do pós-Segunda Guerra e da criação das coleções La Croix du Sud e Du Monde Entier, pela editora Gallimard, uma das mais prestigiosas do país. Os autores contribuem com a nossa discussão ao apontarem as questões socio e geopolíticas envolvidas em uma escolha de tradução, notadamente, em se tratando de um país periférico (em relação ao mercado de tradução mundial) a um país central. A obra de Ramos, segundo eles, abre perspectivas para um estudo mais profundo das relações entre o Norte e o Sul global. Giulia Manera faz um estudo pioneiro sobre a circulação da obra de Djamila Ribeiro (1980-) na França, articulando-a à emergência das Edições Anacaona, projeto editorial original que reconfigurou o lugar da literatura brasileira no país. Manera nos apresenta a potência dos estudos críticos que articulam o saber acadêmico aos movimentos sociais, como o feminismo negro, e outros. Rita Godet, estudiosa das obras literárias ameríndias, produzidas no Brasil e no Quebec, aponta para a importância de, através da alteridade ameríndia e das representações que lhe são próprias, repensar o imaginário do espaço nas Américas. A autora destaca escritoras ameríndias e suas contribuições ao pensamento sobre a memória das raízes ancestrais, os traumas, a integração dos ameríndios no presente, as perspectivas para o futuro e a busca do diálogo com outras nações. A discussão de Godet traz como contribuição a reflexão sobre a convivência entre sistemas tão diferentes quanto o das sociedades ameríndias e ocidentais, em um diálogo original no qual a questão do espaço – e da memória espacial – merece destaque. Encerrando a sessão, José Eduardo Franco e Ricardo Ventura revisitam a obra do padre português Antônio Vieira (1608-1697) afirmando suas diversas utilizações ao longo do tempo, com destaque para as recentes manifestações de repúdio às homenagens feitas ao personagem no espaço público português. Os autores contribuem com nosso livro ao trazerem à tona a crítica às representações do império português no espaço público e o modo como cada época, seja durante regimes autoritários ou no contexto da democracia, percebe e dialoga com o suas heranças.

A terceira e última parte de Colonialismos e Colonialidades: teorias e circulações em português e em francês tem como título circulações e mídias e se inicia com o artigo de Nuno Medeiros a propósito das relações entre a política colonial do Estado Novo e o desenvolvimento das ciências humanas e sociais em Portugal. Medeiros utiliza como corpus uma série de publicações financiadas pelo Estado Novo português com o objetivo de dar a conhecer as características do império colonial e de seus habitantes. O pesquisador reflete sobre o fato de as ciências terem participado à retórica da civilização, baseada em uma ideologia de dominação e discriminação. Mesmo quando esta retórica evolui, buscando transformar o caráter doutrinário e racista em pregação do multiculturalismo e da mistura entre os povos, a lógica colonial permanece e é difundida através de múltiplos projetos editoriais financiados pelo Estado. Angélica Amâncio, por sua vez, dedica-se à análise das representações da sociedade brasileira na França, através do estudo de algumas histórias em quadrinho (ou bandas-desenhadas), recentemente traduzidas e premiadas em festivais e feiras do livro. A autora demonstra como predomina, neste sentido, a visão de um Brasil desigual e periférico e como os projetos editoriais são importantes na construção e na desconstrução de imaginários que podem ou não atrair o público estrangeiro. O artigo de Luciana Salazar sobre a literatura nativamente digital encerra nosso livro através de uma perspectiva original e desafiadora, a dos estudos em Humanidades Digitais. Salazar aponta para as questões que surgiram quando da elaboração do projeto Observatório da Literatura Digital Brasileira e de seus resultados. A autora articula ainda o projeto a outras iniciativas latino-americanas que apontam para uma renovação da teoria literária a partir do que o digital traz de novo em relação à técnica, à poética, à estética, a questões políticas e sociais e à superação das fronteiras geográficas da literatura14.

Convite #

Cara e caro leitor, Colonialismos e Colonialidades: teorias e circulações em português e em francês é um projeto que visa o diálogo e a comunicação entre disciplinas, países, línguas e espaços públicos diferentes. É neste sentido que o projeto foi criado para ter a sua contribuição. Ainda que os textos tenham sido escritos por pesquisadores e pesquisadoras universitários, espera-se que atrizes e atores do espaço público possam integrar, através dos seus comentários, reflexões, sugestões e críticas, temas que ampliem as perspectivas aqui lançadas. Espera-se, igualmente, que este livro sirva para ampliar a rede de investigadores/as e de colaboradores/as interessados/as na temática dos colonialismos históricos e das colonialidades contemporâneas em termos de circulação e recepção.

Naquilo que toca a parte técnica, o objeto que você, leitora e leitor, está a experienciar também participa e procura se posicionar quanto à discussão sobre os colonialismos e as colonialidades. Isto se dá de múltiplas formas: a) pela elaboração deste objeto digital pelas mãos de profissionais atuando no Brasil, no Canadá, na Bélgica, na França e em Portugal; b) pela criação de um objeto digital de acesso livre, bilíngue e interativo, de modo a facilitar a comunicação; c) pela estratégia de difusão aqui aplicada, em que pesquisadoras e pesquisadores foram convidados a participar dos textos com seus comentários15.

Faça parte desta experiência digital e deixe aqui a sua participação!

Références #

Santos, Boaventura de Sousa. 2003. « Entre Próspero e Caliban: colonialismo, pós-colonialismo e inter-identidade », Novos Estudos Cebrap, n° 66 : 23-52.

 


  1. Escrevo pós-colonial e poscolonial para evidenciar a diferença entre, respectivamente, uma literatura produzida em contexto de descolonização ou após o fim da colonização (marca cronológica), de uma literatura produzida no interior do chamado Postcolonial Studies, campo de pesquisa de origem anglo-saxônica, mas que tem incorporado referências francesas. ↩︎

  2. Para entender melhor estas e outras nuances dos diferentes vocábulos utilizados neste livro, recomendo a leitura de Cahen, Michel. 2018. Introdução - que pode ser e o que não pode ser a colonialidade: uma abordagem “pós-póscolonial” da subalternidade. In __________ & Braga, Ruy. Para além do pós(-)colonial. São Paulo : Alameda: 31-73. ↩︎

  3. Acrônimo de : Circulação da Literatura Pós-colonial em línguas francesa e portuguesa (financiamento Bourgeon 2022). Percebe-se, pelo título do livro que você está lendo, que a utilização do termo “pós-colonial” no título do projeto já estava fadada a modificações. ↩︎

  4. Outro destes passos foi dado pelo próprio Christian Côte, ao apresentar o projeto ORCO2C: Organiser les connaissances à propos des cultures post-coloniales (financiamento Bourgeon 2023) e a iniciativa editorial de Angélica Amâncio, com o livro (a ser publicado), Arte, mulheres e colonialidades na Améfrica Ladina. ↩︎

  5. Quando falo em desigualdade aqui, refiro-me principalmente ao mercado de tradução e ao mercado editorial global. ↩︎

  6. Sendo a bibliografia sobre os estudos poscoloniais imensa, eu gostaria de indicar, em Portugal, a coleção coordenada por Ana Mafalda Leite e al. Nação e narrativa pós-colonial, e Hiddlestone, Jane. 2014. Understanding Postcolonialism. Houtledge (já traduzido em português). Este livro é especialmente interessante porque a autora procura juntar a literatura própria ao campo de estudos poscoloniais com outras referências e mesmo com a literatura anticolonial, construindo, assim, um sentido tão amplo para o termo poscolonialism que temos a impressão de que ele é uma totalidade sem fim que inclui a anglofonia e a francofonia (a autora analisa, por exemplo, Marx, Lévinas, Gandhi, Derrida, Foucault, Fanon junto a Sartre, ao Coletivo de Estudos Subalternos, Bhabha e Glissant etc.). O poscolonialism, para a autora seriam: “as múltiplas respostas políticas, econômicas, culturais e filosóficas ao colonialismo, de sua inauguração aos dias atuais”, ou seja, integrariam estudos sobre os “efeitos e implicações amplos e multifacetados do governo colonial”, mas também movimentos específicos de resistência ao colonialismo, comumente definidos como “anticoloniais”. ↩︎

  7. Do mesmo modo que pós-colonial e poscolonial, trazem acepções diferentes neste trabalho, decolonial trata do campo de estudos fundado pelo coletivo Modernidade/Colonialidade nos anos 2000, e descolonial trata do processo de descolonização nos continentes colonizados. Muitos livros de síntese também têm sido escritos em torno deste termo. Para uma compreensão rápida da multiplicidade de seus sentidos, gostaria de indicar os livros de Philippe Colin et Lisell Quiroz, Pensées Décoloniales (Zones); Stéphane Dufoix, Décolonial (Anamoste); Heloísa Buarque de Hollanda, Pensamento feminista hoje: perspectivas decoloniais e a introdução do Dictionnaire Décolonial, organizado por Claudia Bourguignon Rougier em 2021. ↩︎

  8. Este nome é especialmente conhecido pela publicação homônima de Santos, Baventura; Meneses, Maria Paula. 2009. Epistemologias do Sul. Coimbra: Almedina/CES. O livro contém textos de pensadores decoloniais, como Aníbal Quijano, Nelsón Maldonado-Torres e Ramon Grosfoguel, e foi publicado em Portugal, no Brasil e na França. ↩︎

  9. O projeto ORCO2C (em curso – comandado por Christian Côte) em que especialistas dos quatro sistemas linguísticos (francês, português, inglês e espanhol) estão sendo entrevistados em termos conceituais, mostra a complexidade destes usos segundo cada indivíduo/disciplina/país. ↩︎

  10. Ver https://www.cnrtl.fr/definition/colonialisme ↩︎

  11. Quijano, Aníbal. 1992a. Colonialidad y modernidad/racionalidad. Perú Indígena 13 (29): 11-20, p. 11. https://www.lavaca.org/wp-content/uploads/2016/04/quijano.pdf↩︎

  12. Santos, Boaventura de Sousa. 2003. « Entre Próspero e Caliban: colonialismo, póscolonialismo e inter-identidade », Novos Estudos Cebrap, n° 66 : 23-52. ↩︎

  13. Ashcroft, Bill; Griffiths, Gareth; Tiffin, Helen. 1989. The Empire writes back. Routledge, p. 03. ↩︎

  14. O Observatório, tratando da literatura nativamente digital brasileira, dialoga com projetos franceses, como o ANR-LIFRANUM, de Gilles Bonnet. ↩︎

  15. Gostaria de agradecer, neste sentido, a Anaïs Geraci, estagiária deste projeto, que nos ajudou a elaborar a estratégia de divulgação do livro. ↩︎

Para citar este texto:

Natália Guerellus. 2023. « Apresentação ». In Colonialismos e Colonialidades: teorias e circulações em português e francês, Guerellus, Natália. Lisbonne-Lyon : Theya Editores - Marge - MSH Lyon Saint-Étienne. https://cosr.quaternum.net/pt/00.

Natália Guerellus

Universidade Jean Moulin Lyon 3

natalia.guerellus@univ-lyon3.fr

Pesquisadora e professora adjunta, diretora do departamento de português da Universidade Lyon 3. Coordenadora do projeto CILIPO-FP (financiamento Bourgeon 2022), que deu origem a este livro. É historiadora, especialista do Brasil e do Portugal contemporâneos, notadamente naquilo que concerne a história política, os estudos literários e os estudos de gênero e feministas.